quinta-feira, 2 de junho de 2016

Que lembre...


Que lembre...

 

Vai começar. Cadê?

Abri os olhos devagar, até acostumar com a claridade que atravessava os vidros da janela, depois de driblar a chuva fina. Enxerguei cada coisa: A escola, professora chata, dever de casa; mas, também a feira, o ceguinho das pernas compridas sentado num banquinho pedindo esmolas, os bois e cavalos de barro, o mercado de farinha. Aproveitei o tempo que restava curtindo o calorzinho. A água fria despertou meu corpo. Esquentou depois que vesti a roupa. Vou botar folhas de jornal dobradas dentro dos sapatos, se não, molho os pés.

Na bolsa, dentro do caderno, dos livros. Não encontrei.

Hum! Que cheiro bom. Segui o rastro identificando cuscuz e café, da mercearia; queijo coalho e ovos, da feira. Nesta época as comidas de milho reinavam: pamonha, canjica ou cozido. Todos os dias, na garupa de uma bicicleta, chegava o pão. No lombo do burro era o leite. Lá estava a família na mesa. Cada qual trazendo para um prato alguma delícia.

No chão desde a entrada, passando pelo corredor, salas e nada.

Era divertido ver a água saltar das poças quando pisava; o trem chegando na estação com um longo apito. Na esquina, o cheiro forte de cachaça misturado com o de charque. Alguns homens bebiam no balcão da venda. Trabalhavam perto. Uns, alugando as carroças estacionadas sob uma árvore frondosa no largo em frente, onde os cavalos tinham sossego entre os fretes; outros, consertavam lonas que cobriam cargas de caminhões. Uma estendida, tomava quase toda a calçada. Observava o trabalho de lixar, espalhar a cola, posicionar o remendo e bater com um martelo de borracha. Por vezes tinha que correr para não atrasar.

Deixei em casa? Caiu na rua?

A algazarra da criançada, a procura de seus lugares nos bancos compridos, ultrapassava as divisórias de madeira a meia altura das salas e explodia no alto do grande salão.

Passei a mão sobre os bolsos da calça; da camisa.

- O lápis!
AJFontes